segunda-feira, 30 de março de 2009

Ver para além do olhar

Há locais que me emocionam. Podem ser concorridos, apinhados, agitados, e são-nos para muitos puramente impessoais, mas eu descubro neles muito mais do que uma mescla de corpos que se movimentam, ao reconhecer um leque de sentimentos camuflados que se escondem por detrás da aparente azáfama. Um desses meus locais de eleição são as chegadas dos aeroportos. Delicio-me a observar os comportamentos de quem chega e de quem ansiosamente aguarda essa chegada.

A observação de comportamentos é em mim um gosto inato que se tem revelado ditador de muitas escolhas pessoais e também aqui, na sala de espera de um aeroporto, me faz gostar de ver muito para além de olhar.

Não me considero incluida na categoria das pessoas lamechas mas há emoções que se me assomam com alguma facilidade. Digamos que tenho umas lágrimas a que posso chamar discretas mas cujo cloreto de sódio por vezes se exibe com alguma prontidão.

É por toda esta emotividade que não me custa nada ir buscar alguém ao aeroporto, mesmo quando o avião se atrasa, porque eu comodamente me sento a um canto e me alimento dos sorrisos de quem chega, das lágrimas felizes de quem espera, dos abraços alheios, das famílias inteiras que se reúnem e até das lambidelas saudosas de muitos canídeos que partilham a espera com os restantes elementos da família.

Há os reencontros românticos, há os que chegam cansados, há os que chegam ébrios de saudades, há os que recebem ramos de flores, há os que se beijam, os que apenas se entreolham, os que se apaixonam novamente. Mas há também os solitários, os indiferentes, os contrariados. Nas chegadas de um aeroporto há todo o repertório da conduta humana e dos afectos que lhe são inerentes.

E eu, eu quase que me esqueço que também espero alguém e que esse alguém também me reencontra e que dessa união resultará uma energia afectiva já não somente observada mas igualmente sentida e à qual se seguirá a pergunta da praxe “Então, gostaste?"

quarta-feira, 25 de março de 2009

(Matur)idade

Durante muito tempo fui a mais nova no meu trabalho. Se por um lado era por vezes difícil mostrar a terceiros que a idade nem sempre é sinónima de experiência, o estatuto de caçula dava-me algum gozo, aquele sentimento de protegida que inconscientemente nos sabe bem.
Pois bem, já há algum tempo que esse papel deixou de ser meu. Longe de ser a mais velha, já tenho quem trabalhe comigo e tenha nascido nos anos 80 o que, parecendo que não, me dá um certo peso à idade, equivalente a quando me chamam de "Dona" e acto instantâneo me vejo com mais 20 anos em cima.
Mas acho mesmo que atingimos a maturidade quando alguns acontecimentos que nos lembramos muitíssimo bem (daqueles que fazem uso à expressão: "lembro-me como se fossem ontem!") já aconteceram há mais de 20 anos. Quando pela primeira vez me apercebi deste facto fiquei um pouco agastada, é que 20 anos são duas décadas, são 7300 dias mais uns quantos milhares de horas. Convenhamos que é muito tempo.

Um desses momentos de agastamento surgiu há pouco tempo quando vi ou ouvi que a música “We are the world” (aquela sobejamente conhecida que juntava músicos tão distintos como Michael Jackson, Bruce Springsteen, Cindy Lauper, Stevie Wonder, entre muito outros, e que hoje em dia está praticamente reservada a sessões de karaoke) comemorou os seus 24 anos.

Tive imediatamente um flash-back, não sem antes colocar a minha melhor expressão boquiaberta perante esta efeméride, ao relembrar-me quantas vezes eu cantei essa música em versão repeat, tentando imitar as várias vozes dos seus intérpretes. Bolas estas tardes de desafinação já foram há 24 anos???? Será que os meus vizinhos se lembram tão bem delas quanto eu?
O que espero é que daqui a 24 anos esteja a recordar algo idêntico, como por exemplo os decibéis que emito enquanto conduzo ao som dos "Buraka Som Sistema". Pelo menos aí não há vizinhos, só se as queixas vierem das cordas vocais!